ESPAÇOS EXTERNOS NA EDUCAÇÃO INFANTIL: UM ESTUDO SOBRE A ARQUITETURA E ÁREAS VERDES
Géssica Gaspar
Jessica Bonato
INTRODUÇÃO
O tempo e o espaço tem suas representações diferenciadas entre os mais amplos contextos sociais e culturais, pois conforme Durkheim (1979) as interações dos indivíduos permitem a percepção sobre si mesmos com base no momento histórico qual estão inseridos..
A Educação Infantil mostra em suas mais diferentes pesquisas que seus eixos norteadores são a interação e a brincadeira, porém quando se fala sobre esses dois aspectos logo pensamos nos lugares e nas situações em que ocorrem. As unidades de Educação Infantil da rede pública de Curitiba são os locais considerados nesta pesquisa. Neste sentido, faz-se necessário pensar sobre esses espaços arquitetônicos nas aprendizagens e construções das crianças e principalmente como o mesmo é compreendido por elas. Este estudo traz apontamentos com base em documentos inerentes à Educação Ambiental e Educação Infantil no âmbito arquitetônico, relacionando assim com as práticas observadas nas relações entre os sujeitos da educação e a organização dos espaços que venham a corroborar com tais premissas e críticas. Neste sentido, almeja-se promover uma leitura com provocações e discussões acerca da temática.
No ano de 2017 um Centro Municipal de Educação Infantil da rede pública municipal de Curitiba foi analisado a fim de se contextualizar as premissas da Educação Ambiental, as relações da rotina da Educação Infantil com a natureza. Localizado numa região periférica da cidade que conta com diversas indústrias e empresas. A metodologia utilizada nas observações configura-se na modalidade de “observação participante [...] a técnica pela qual se chega ao conhecimento da vida de um grupo a partir do interior dele mesmo.” (GIL, 1987, p. 103). Neste sentido, as rotinas e os sujeitos da Educação Infantil foram analisados à luz da Educação Ambiental e compreendidos na esfera da pedagogia crítica, trazendo a educação em suas relações entre os sujeitos e organização dos tempos e os espaços.
O espaço da escola, reservado especialmente para elas, deveria então contemplar, além dos espaços destinados às atividades educacionais, espaços para o encontro e para o brincar. Deveria possuir uma arquitetura que respondesse integralmente, pelo menos no período em que as crianças permanecem ali, a essa necessidade, pois também no brincar, as crianças aprendem a se concentrar e a estabelecer as relações com os objetos, com as pessoas e com a natureza. O aprendizado não acontece só nas salas de aula e nas outras atividades escolares, mas também no processo do brincar. Sendo assim, observa-se que a qualidade de vida das crianças está intimamente relacionada com a qualidade do espaço escolar que frequentam. (SANTOS, 2001, P.16)
Conforme aponta Santos (2001), a atividade lúdica tem papel fundamental no processo de desenvolvimento e aprendizagem infantil e um espaço escolar complexo e polivalente, se apresenta como um agente facilitador no processo, assim considera-se indispensável uma projeção espacial específica para as crianças, compreendendo principalmente as crianças como sujeitos de cultura própria, onde através da interação com seus pares nos mais diversos espaços oferecidos pela escola reformulam vivências. Corsaro (2002), entende tal ação como reprodução interpretativa, onde as crianças não só internalizam individualmente a cultura adulta que lhes é externa, mas se tornam parte da cultura adulta, e contribuem para a sua reprodução através das negociações com adultos e da produção criativa de uma série de culturas de pares com as outras crianças.
Pensando em tais relações das crianças com o meio e com seus pares, este artigo discute acerca da importância de fatores externos às salas de aula, presença de áreas verdes e intervenções possíveis nas mesmas e ainda a preocupação em desenvolver uma arquitetura escolar onde se pense nas particularidades da criança e da essência da Educação Infantil, o brincar e a interação. Segundo o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (1998, p. 68) os espaços também são colocados em pauta como “elementos essenciais de um projeto educativo”, e discorrem ainda sobre a importância das diversas ações de modificação do meio pelas crianças e professoras.
Na área externa, há que se criar espaços lúdicos que sejam alternativos e permitam que as crianças corram, balancem, subam, desçam e escalem ambientes diferenciados, pendurem-se, escorreguem, rolem, joguem bola, brinquem com água e areia, escondam-se etc. (BRASIL, 1998. p. 69)
Assim o espaço disponibilizado no Centro Municipal de Educação Infantil estudado, conta com locais que motivam e levam os sujeitos do processo educativo, crianças e professores, à interação com a natureza e principalmente a exploração de diversas vivências e movimentos. Cabe, porém, que essa intervenção seja possível e vivida efetivamente pelas crianças, como instrumento de aprendizagem, tornando-se necessária então, uma reflexão que relacione as interações e aprendizagens diretamente com o espaço físico escolar.
ARQUITETURA DAS ESCOLAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL
O espaço escolar é um componente que aponta para o significado de infância e também para o contexto social e histórico levados em consideração em sua construção. Conforme enfatiza Lima (1989), o espaço tem grande interferência no disciplinamento das crianças e no controle dos movimentos corporais, em suas pesquisas aponta para duas utilizações dos espaços, primeiro como elemento para o condicionamento da criança para a constituição do futuro adulto passivo, conforme padrão estabelecido na sociedade e segundo, como instrumento para a formação de adultos criativos e inteligentes. Na segunda utilidade, compara o espaço a um laboratório, onde haja a liberdade de criar e experimentar.
A organização e a distribuição dos espaços, a limitação dos movimentos, a nebulosidade das informações visuais e até mesmo a falta de conforto ambiental estavam e estão voltadas para a produção de adultos domesticados, obedientes e disciplinados – se possível limpos –, destituídos de vontade própria e temerosos de indagações. Nesse processo, somos todos corresponsáveis. Há, em todos os lugares, como que a obsessão do controle que perpassa todos os nossos comportamentos adultos em relação à criança; precisamos sentir-nos donos da situação, ter presente todas as alternativas que a criança poderá escolher, porque só assim nos sentiremos seguros. A liberdade da criança é a nossa insegurança, enquanto educadores, pais ou simples adultos e, em nome da criança, buscamos a nossa tranquilidade, impondo-lhes até os caminhos da imaginação. (LIMA, 1989. p. 10-11)
A partir de tal pontuação leva-se à reflexão na questão da organização dos espaços pelos adultos e principalmente a limitação da passagem de um espaço ao outro, tornando o espaço em que a criança passa grande parte do seu dia em áreas que aguçam sua curiosidade, mas que são impedidas de transpor e investigar. De acordo com Horn (2007, p.27) a maioria das escolas brasileiras ainda oferece um espaço que determina a disciplina, levando a criança a viver em uma “imobilidade artificial”, onde os arranjos escolares dificultam a interação entre as crianças, e os espaços da sala são organizados pelo adulto como locais de “pré-alfabetização”. Nesse ponto, deixa-se de lado os espaços externos como aliados na prática docente, uma vez que esses entendem que é necessário haver um quadro negro, folhas, lápis e crianças sentadas para que efetivamente exista o que chamam de “processo ensino-aprendizagem”.
No Brasil existe ainda uma lacuna entre o projeto pedagógico e o projeto arquitetônico escolar. Nas escolas públicas, especialmente, ainda construídas de forma simplista e a partir de práticas projetais convencionais, percebe-se, além da deterioração e falta de manutenção das instalações, um descaso com fatores funcionais e que os aspectos físicos do edifício escolar nem sempre estão associados ao processo de aprendizagem infantil. (SANTOS, 2011. p. 16)
Acerca da busca pela qualidade arquitetônica das escolas, o MEC disponibilizou em 2006 os Parâmetros básicos de infraestrutura para instituições de Educação Infantil, que dispõem que para o início do projeto deve haver a participação de todos os envolvidos na Educação Infantil, inclusive as crianças. Além de tais proposições, apontam também que a construção deve levar em consideração:
A) a relação harmoniosa com o entorno, garantindo conforto ambiental dos seus usuários (conforto térmico, visual, acústico, olfativo/qualidade do ar) e qualidade sanitária dos ambientes;
B) o emprego adequado de técnicas e de materiais de construção, valorizando as reservas regionais com enfoque na sustentabilidade;
C) o planejamento do canteiro de obras e a programação de reparos e manutenção do ambiente construído para atenuar os efeitos da poluição (no período de construção ou reformas): redução do impacto ambiental; fluxos de produtos e serviços; consumo de energia; ruído; dejetos, etc. D) a adequação dos ambientes internos e externos (arranjo espacial, volumetria, materiais, cores e texturas) com as práticas pedagógicas, a cultura, o desenvolvimento infantil e a acessibilidade universal, envolvendo o conceito de ambientes inclusivos. (BRASIL, 2006a. p. 21)
Com as orientações dos documentos investigados, nota-se que cada instituição deveria ser pensada em suas singularidades. Há também que se pensar que em cidades como Curitiba onde durante grande parte do período anual há frio e chuvas, os lugares de interações nas áreas internas dos CMEIs também deveriam ser pensados e projetados para que a interação entre as crianças e experiências não ficassem prejudicadas.
ÁREAS VERDES NOS ESPAÇOS DE EDUCAÇÃO INFANTIL
No espaço escolar possibilita-se estruturalmente meios para o desenvolvimento infantil em seu mais amplo sentido. Assim sendo, assume-se que o ambiente possui a versatilidade de favorecer diferentes tipos de interações entre a criança e o meio (BRASIL, 2006a). Isto é, concebe-se que, de fato, o meio escolar sendo seus recursos físicos; a arquitetura do espaço em si; a estrutura e demais elementos concretos podem trazer favorecimentos à interações, possibilidades de exploração e experiências na Educação Infantil. Desta forma, compreende-se a presença de elementos nesta estrutura escolar, tais como áreas verdes e naturais nas dependências do espaço escolar é demasiada significativa para o desenvolvimento infantil:
A interação com o ambiente natural estimula a curiosidade e a criatividade. Sempre que for possível, deve-se prover um cuidado especial com o tratamento paisagístico, que inclui não só o aproveitamento da vegetação, mas também os diferentes tipos de recobrimento do solo, como areia, grama, terra e caminhos pavimentados. (BRASIL, 2006a).
Neste sentido, ao se trazer para o meio escolar as áreas verdes, isto é: recursos naturais arborizados, verdes, vivos e que exalam a sensação de se viver a natureza, contempla-se a capacidade inerente a meio ambiente e sua conservação citada no Referencial Curricular Para a Educação Infantil em:
Observar e explorar o ambiente com atitude de curiosidade, percebendo-se cada vez mais como integrante, dependente e agente transformador do meio ambiente e valorizando atitudes que contribuam para sua conservação. (BRASIL, 1998)
Inclusive, há nos Parâmetros de Qualidade da Educação Infantil a sustentação da ideia salientada do convívio da criança com o meio ambiente, o mundo natural: “é necessário que sejam oferecidas às crianças (...) condições de usufruírem plenamente suas possibilidades de apropriação e de produção de significados no mundo da natureza (...).” (BRASIL, 2006b).
Consequentemente, no trabalho pedagógico na Educação Infantil através da natureza enquanto esfera experimental, empírica e repleta de vivências por parte da criança, que se refletem concepções ecológicas nas próprias crianças. Ao se pensar sobre a relação das crianças com a natureza, Tiriba (2008) traz o sentido ecológico nestas interações, que o cuidado individual da criança, o cuidado com o outro e o cuidado com a Terra é viabilizado nelas. Desta forma, ao se imergir num panorama de meio ambiente na Educação Infantil, e o direito da criança em estar inserido neste, pode-se sustentar com mais propriedade através das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental (BRASIL, 2012b) que traz o direito ambiental como parte dos direitos universais no art. 2, §1.
No aspecto cultural-ambiental, Tiriba (2005) explora que a criança é, simultaneamente, um ser da natureza e da cultura. Isto é, a criança é fruto de uma história que se propaga, se reproduz e também se modifica em suas esferas sociais de convivência, deste modo, suas implicações enquanto sujeito da sociedade é indissociável do ser da natureza, qual necessita dela e tem o dever ambiental do seu cuidado. Tiriba (2005) também traz que a criança é uma espécie que se renova, quer dizer, pode-se compreender que o trabalho pedagógico iniciado na Educação Infantil com o cunho ecológico poderia estar em constante evolução, aprimorando-se no sentido de desafios das infelizes premissas e lapsos que ocorrem nas rotinas da Educação Infantil, quais impedem a plena exploração da natureza pela criança. Portanto, entende-se que o ser da cultura já está assegurado por propostas pedagógicas, no entanto o ser da natureza tem a necessidade constante de ser refletido, convidado a ser reiterar no meio natural para a experimentações e contato com a natureza.
O antropocentrismo é um lamentável elemento dentro da degradação ambiental e para a sua sustentabilidade ecológica, uma vez que a criança enquanto ser da cultura (TIRIBA, 2005) tem seu histórico, ponderações, opiniões e demais conhecimentos pautados e embasados em experiências sociais com seus círculos de convívio, colocando desta forma, que a vivência com o meio ambiente pode ser secundarizado ou desinteressante. Pois a atual relação do ser humano com a natureza, trata-se de dominação e controle da natureza pela humanidade. A visão antropocêntrica deve ser reeducada, tendo seu olhar descentralizado, uma vez que deve haver dialética na relação humano - natureza, para o cuidado, bem como a desmistificação do estranhamento do ser humano e da natureza, pois estes devem ser visto como parte de um todo conjunto e interligado. A supervalorização do racional intelecto humano que o desvincula de seu corpo (TIRIBA, 2005) enquanto elemento natural, animal, sensitivo, fisiológico e completo inerente a natureza, também contribuem para a negligência da natureza pelo homem.
A partir de tais premissas antropocêntricas, é possível repensar no âmbito da Educação Infantil enquanto realidade cotidiana, diária, prática e real nos centros de Educação Infantil. Por conseguinte, a degradação e desuso de espaços naturais e áreas verdes são corriqueiras, e as vivências e experimentos nestes locais são atribuídos com trivialidade. Como salienta Hoemke:
Não são pensados para crianças alegres e brincalhonas, (...) mas para “massas de crianças” (...). Roubam das crianças o direito a flores e gramados, à água no pátio, barro, areia, salas amplas, abertas, coloridas, saudáveis (2004, p.18).
Não obstante, a precarização de notoriedade à natureza e Educação Ambiental na Educação Infantil reflete, inclusive, na rotina diária dela, que é arbitrariamente destituída de explorar os espaços externos e elementos naturais existentes pelas crianças. Pois estes elementos e espaços são preconcebidos negativamente pelos sujeitos da Educação Infantil, tais como sujeira, bagunça, doença e perigo. Estima-se que a prática docente seja revista, a fim de que se idealize as relações com a natureza como direito da criança, e se promova a concepção ecológica nas crianças da Educação Infantil.
A ROTINA E O CONTATO COM A NATUREZA
Durante as 11 horas de funcionamento do Centro Municipal de Educação Infantil que foi objeto de estudo desta pesquisa, pode-se notar a rotina conduzida pelas professoras e seguida pelas crianças. Quer dizer, os cronogramas registrados e acordados entre os profissionais que atuam nas instituições são facilmente interiorizados pelas crianças, que executam e percebem os exercícios temporais e dinâmicos organizacionais. Durante todo o período de permanência das crianças, apenas cerca de 2 horas se passavam fora da sala de aula, sendo distribuídas entre o parque, horários de alimentação no refeitório e idas ao banheiro. Em sua tese de doutorado, Tiriba traz a pesquisa:
Em quarenta instituições de Educação Infantil vinculadas à rede pública, que atendem em horário integral – constatamos que as crianças permanecem em espaços entre-paredes durante 8, 9, 10 horas ou mais, sendo que, em 10% das instituições investigadas, elas dispõem, diariamente, de um curto período de 30 a 60 minutos ao ar livre. No caso dos bebês e dos que têm até 2 ou 3 anos, evidenciou-se uma situação de aprisionamento, pois, nas unidades que não dispõem de solário, até mesmo o banho de sol pode não acontecer! (TIRIBA, 2008 p. 47)
Tiriba (2008) usa o termo emparedamento para designar a permanência assídua dentro de sala de aula pelas crianças. Pode-se considerar a situação do emparedamento mesmo durante algumas atividades mais frequentes na rotina, quer dizer, as propostas que sugerem a exploração do tempo vigente, percepção da temperatura, de elementos celestes como o sol e nuvens, quer dizer a “janela do tempo”. É possível notar aqui o emparedamento, inclusive nestes momentos onde se trata do tempo, o ar livre, temperatura, a sensação do ambiente externo. Tal situação corrobora com ambiguidade dentro do espaço educativo, pois uma vez que as atividades na Educação Infantil tem finalidade pedagógica, também se nega o contato com o concreto, o ar livre neste caso.
Portanto, ao se viabilizar o distanciamento das crianças com o pleno contato com a natureza, a fim de se enaltecer que elas sejam condicionadas a uma possível ordem e centralidade na rotina, é revelado o olhar adultocêntrico na metodologia desta Educação Infantil. Quer dizer, a justificativa adulta em manter o controle sobre as crianças na rotina, num monólogo, privando as crianças do contato experimental e ativo, assim as docilizando e propagando “(...) a ordem escolar: filas de alunos nas salas; (...) determinando lugares individuais (a organização de um espaço serial) tornou possível o controle de cada um e o trabalho simultâneo de todos (...)” (FOUCAULT, 1987, p. 126).
Por conseguinte, foi observado nos momentos em que as crianças saem para o ambiente externo, ainda há a arbitrariedade adulta em limitar alguns espaços e comportamentos a fim de privar a criança da exploração da natureza. Isto é, ao se condicionar a exploração de áreas verdes e ambientes naturais, como os espaços do parque, pode-se inviabilizar a experiência das crianças possibilitadas pelo meio.
Nas falas das profissionais, as razões do distanciamento relacionam-se com a identificação dos elementos do mundo natural com a sujeira, a desorganização, a doença, o perigo. [...] A análise dos dados revela que a conexão com a natureza não é considerada como um direito das crianças, [...] não está relacionada a um objetivo pedagógico, mas depende da boa vontade dos adultos, das condições climáticas, da permissão das famílias, dos temores dos gestores... enfim de um conjunto de fatores que isolados ou articulados configuram um cotidiano de confinamento. (TIRIBA, 2017, p.76)
Isto posto, a negação às crianças sua exploração da natureza, trata-se de não somente uma violação de seu direito enquanto um ser da natureza e da Terra, como também uma contradição pedagógica ao privar a criança da descoberta. Pois as áreas de vegetação do Centro de Educação Infantil, viabiliza as áreas verdes que estão presentes no meio escolar, porém ao ser destituído o direito da criança em apropriar-se do seu próprio espaço, do local onde teve sua arquitetura projetada para ela mesma, onde ela é a protagonista nos processos diários. É notável a carência de práticas pedagógicas numa idealização ecológica (TIRIBA, 2008) que seja vinculada a uma práxis que se priorize as necessidades, curiosidades, anseios, desejos e sede de descoberta das crianças, ofuscando o olhar adulto preocupado em impedir bagunça e sujeira delas.
Tiriba (2005) faz menção a Espinosa ao ponderar a sadia saída de sala de aula para áreas externas propiciando, assim, experiências bem como permitindo suas preferências das crianças à estes espaços:
As crianças declaram sua preferência pelos espaços abertos, em contato com a natureza, porque são modos de expressão desta mesma natureza (Espinosa, 1983). Mas as rotinas as mantêm distanciadas: mesmo que se deslocando de um espaço para outro, a maior parte do tempo permanecem emparedadas, contribuindo para que não se vejam e não se sintam como parte do mundo natural. (TIRIBA, 2005)
A leitura de exploração da natureza no âmbito da Educação Infantil pode ser realizada em andar descalço na grama; experimentar a chuva, o vento, banho de lama; coletar folhas, flores, pedras; subir em árvores; conhecer e tocar em insetos; construir, amontoar, cavar, criar e empilhar pedras, barro e areia; experimentar as frutas direto da natureza e entre outras práticas que viabilizem a vivência significativa da natureza. Por fim, para um propósito ecológico efetivo na Educação Infantil, onde o cuidado com a Terra seja de fato vivido e apreendido nas vivências da primeira infância, é preciso que de fato as crianças convivam com estes elementos naturais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao refletir acerca da estruturação do espaço arquitetônico real das instituições de Educação Infantil, e relacioná-la aos aspectos teóricos documentados a fim de sua composição, pode-se notar a necessidade de dialogar com os mesmos. Pois, entende-se que o espaço escolar possui propósito instigador, experimental e aguçado para curiosidades, descobertas e criações para as crianças (LIMA, 1989). Inclusive, no documento “Parâmetros básicos de infra-estrutura para Instituições de Educação Infantil” há menções que incitam a plena participação de todos os envolvidos na Educação Infantil, sendo a comunidade escolar no processo de constituição da arquitetura da instituição em questão, inclusive o público protagonista dos processos: as crianças (BRASIL, 2006a).
Entretanto, no que se refere à prática desempenhada nas realidades dos centros de Educação Infantil, deparamo-nos com realidades distintas, onde a participação da comunidade escolar não é plena, e a prioridade do desenvolvimento da criança é secundarizada. Pois, defronta-se com estruturas arquitetônicas que desconsideram condições climáticas, possibilidades pedagógicas, organização preestabelecida dos espaços e da rotina na Educação Infantil.
Ao se considerar a vivência em áreas verdes dentro do projeto arquitetônico das instituições da Educação Infantil, podemos analisar o distanciamento da prática da proposta teórica. Isto é, há suporte documentado para interações das crianças com o meio natural BRASIL, 1998; 2006a; 2006b), entretanto há adversidades que lhes são impedidas na prática. Ao refletir sobre tal problemática, podemos elencar o comportamento adulto como fator condicionante nas limitações do contato infantil com a natureza, isto é o adultocentrismo. Pois, considerando que há um predisposto por parte adulta em considerar o contato com o meio natural com negatividade, pois o mesmo retrata sujeira, perigo, doenças, bagunças e afins (TIRIBA, 2017), de fato a relação criança – natureza é desassistida.
Ao se trazer o trabalho pedagógico aliado ao ecológico (TIRIBA 2008), deve-se refletir a práxis e levando em conta todos os aspectos que remetem ao desenvolvimento infantil. Estes, que trazem a experimentação, tentativas, toques, vivências, sensações e interações possibilitadas pelo meio qual a criança está inserida. Isto é, negando à criança seu contato com a natureza, nega-se inclusive o direito que ela tem sobre conhecimento de si própria enquanto um ser da Terra, para que então possibilita-se um trabalho pedagógico ecológico (TIRIBA, 2005;2008;2017).
Por fim, almeja-se que a protagonista da Educação Infantil, a criança seja contemplada nos mais amplos aspectos de seus desenvolvimento, a fim de que uma concepção ecológica e convívio com o meio natural desmistifiquem a visão antropocêntrica da natureza estar à serviço da humanidade.
REFERÊNCIAS
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CAMARGO, P. Desencontros entre Arquitetura e Pedagogia. Revista Pátio Educação Infantil, Porto Alegre, ano VI, n. 18, p. 44-47, nov. 2008;
CARVALHO, Isabel Cristina de Moura. Educação ambiental. Educação e Realidade, v. 34, n. 03, p. 11-15, 2009.
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FOUCAULT, Michel. Os corpos dóceis. In: Vigiar e punir: nascimento da prisão. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 1983;
HOEMKE, Ângela. Ambiente de qualidade na educação infantil: elementos constitutivos da sala de crianças de 3 a 5 anos na perspectiva dos professores infantis. Dissertação de Mestrado. Itajaí, SC: Univale, 2004;
HORN, Maria da Graça Souza. Sabores, cores, sons e aromas: a organização dos espaços na educação infantil. Porto Alegre: Artmed. 2007;
LIMA, Mayumi W. Souza. A cidade e a criança. São Paulo, Nobel, 1989;
SANTOS, Elza Cristina. Dimensão lúdica e arquitetura: o exemplo de uma escola de educação infantil na cidade de Uberlândia. Tese (doutorado em arquitetura e urbanismo) - Faculdade de arquitetura e urbanismo- Universidade de São Paulo. São Paulo, 2011
_. Educação e vivência do espaço: diálogos entre a arquitetura e a pedagogia. Revista Presença Pedagógica, 2008, 14.83;
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